Maria Helena fala sobre “Dona Helena”, livro de memórias sobre sua mãe

Para começar, gostaria que você contasse quem é o personagem da história do Pintinho…

(Risos) Você sabe que o Edinho Dentista, que é meu vizinho, estava lendo o livro, saiu na janela e perguntou: “Quem é o homem do pintinho?”. E eu disse que não podia contar, né? O homem ainda está vivo! Se eu contar pega mal!

Como era a sua mãe na intimidade?

Era uma pessoa reservada mas, com a gente, era sempre muito animada. Minha mãe era muito bem humorada!

E a criação da obra?

Em meu processo de criação não houve uma linha condutora. O que veio na minha cabeça eu fui escrevendo. Eu não tinha pretensão de produzir um livro. Apenas criei o hábito de lembrar algumas passagens sobre a minha mãe e ir registrando. Quando contava alguma história sempre alguém dizia para registrá-la e o meu irmão me incentivou a compilar todas elas em um livro de memórias.

Eu escrevi com muito prazer e ri muito enquanto me lembrava porque estava presente e vi todas aquelas histórias. Como a minha mãe viveu bastante e eu cuidei dela até o fim, ficamos muito amigas e foi um prazer recordar de tudo.

Há uma sequência lógica?

Não há… São crônicas esparsas e fáceis de ler. Geralmente as biografias estabelecem sequências e acabam cansativas. O fato de não ter compromisso com o tempo tornou o trabalho mais leve.

Podemos dizer que é sobre a história da comunidade?

Alguém comentou comigo que o livro acabou se tornando o registro de uma época. As pessoas lembram dos doces que a minha mãe fazia, do Bar Royal que frequentavam, da Rua Antônio Moreira e da Rua da Ponte. Tudo isso acabou despertando o interesse dos leitores. Uma das descrições que faço é sobre o natal da nossa família. Como éramos comerciantes, parávamos de trabalhar às dez horas da noite e estávamos tão cansados que íamos para a cama.

O livro me soou como uma história da família, tendo a minha mãe como fio condutor. Eu crio uma árvore genealógica para localizar a vinda da italianada para o Brasil, falo sobre o encontro do casal e, dali em diante, são só histórias…

O seu irmão, Mário, recebeu destaque especial, não é?

O Mário era uma figura. Viveu pouco, mas intensamente. Morreu aos 31, mesmo ano em que o meu pai. Como era muito agradável e tinha o papo muito bom era uma espécie de ídolo na cidade. Todo mundo o protegia, todo mundo lhe queria bem. Foi uma pessoa que deixou saudade e, até hoje, quem lê o livro se emociona.

A vida dele daria outro livro…

Ele tem muita história! O Mário gostava muito de ler! Acho que o meu gosto pela leitura vem dele. Não tinha escolaridade, mas gostava muito de literatura e de estudar sobre a segunda guerra.

Gostei da passagem em que a sua mãe o tirou do baile pelo colarinho.

Nós frequentávamos muito o Centro Operário e, como fui ao baile com um bicho da ETE, os amigos dele o ficaram instigando a brigar com o rapaz. Minha mãe deu um pega nele. Saiu pelo colarinho!

Ele era aficionado pelo Ride Palhaço, não é?

Lá em casa todo mundo sempre foi Ride. O Padóia era o único que torcia para os Democráticos. O Mário ia sempre à frente do Bloco, em cima do carro, com aquelas moças em volta… Teve uma noite que bebeu muito e dormiu antes do desfile. Tinha chegado com um galo na cabeça! A minha mãe deu graças a Deus dele não sair naquela noite e estávamos no alpendre quando vimos o Mário sair quietinho e virar a esquina. Assim que o bloco saiu, lá estava ele, com a porta estandarte, dando tchau pra nós!

E aquela história sobre os bêbados carregando o defunto?

Aquela passagem caberia no seu novo livro, heim?! A casa da minha mãe era no local onde foi a farmácia do Pingo. Ali sempre foi caminho dos defuntos em direção ao cemitério e, não raramente, passavam cortejos com todo mundo bêbado. Ela contava que não foi uma vez só que aconteceu aquilo. O corpo caía quando o fundo do caixão estourava e ela dizia para colocarem sobre a tampa. Então ia em casa, pegava um lençol para cobrir o corpo e o enterro seguia.

E o caso do papagaio da sua mãe?

Esta história foi muito esquisita porque o bicho não estava doente. Acho que ele ficou meio jururu porque a minha mãe andava com ele no ombro e cuidava o dia todo. Quando ela foi ficando doentinha, ele passou a ficar isolado e morreu um dia antes dela.

Você lembra de algum comentário dos leitores?

Uma pessoa chegou a me dizer que recordou do tom da voz da minha mãe. Fiquei contente porque eu queria mesmo que o foco fosse ela. A vida da minha mãe foi turbulenta, como de qualquer pessoa, mas o interessante era a maneira como ela lidava com as adversidades. Acho que o que movia a minha mãe era a fé. Era uma pessoa movida pela religião.

Mais pessoas deveriam registrar o passado familiar...

Ontem o Ricardo Abrahão esteve aqui em casa e me disse a mesma coisa! Que mais pessoas deveriam registrar suas memórias particulares para que não se perdessem com o passar dos anos. Ele até lembrou do Padre José… da quantidade de atividades que empreendeu e que precisam ser registradas.

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