Arquivos secretos do DOPS

O “DOPS” – “Departamento de Ordem Política e Social” – foi criado para manter o controle dos cidadãos e vigiar as manifestações políticas na ditadura, pós-64, instaurada pelos militares no Brasil. Perseguia, acima de tudo, as atividades intelectuais, sociais, políticas e partidárias de cunho comunista.

Entre os anos de 1964 e 1974, em virtude da resistência ao regime militar crescente, o departamento obteve maior autonomia. A partir do momento em que o Brasil se abriu para o processo de redemocratização, a instituição perdeu o sentido e foi extinta. O DOPS exercia função de órgão policial e deixou documentos como ofícios, relatórios, radiogramas e livros que, hoje, servem como pesquisa histórica e fonte de busca de processos judiciais. Há dossiês que descrevem sobre a existência, na época, de eleições sindicais, greves, partidos políticos e atos públicos que eram registrados e vigiados.

Através das dezenas de documentos, é possível perceber que a perseguição ao simpatizantes e adeptos do partido comunista era feroz. Em uma extensa lista, os agentes traçaram um perfil detalhado de cada uma das pessoas consideradas simpatizantes do partido. A maioria era formada por líderes sociais, estudantes, profissionais liberais e maçons. Nesta pesquisa, vasculhamos os documentos secretos do DOPS e encontramos muitas informações sobre a sua atividade em Santa Rita. Em diversos casos, omitimos os nomes dos envolvidos para não expor as vítimas. Acompa-nhe agora, como funcionou o período de repressão na cidade.

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ALN em Santa Rita do Sapucaí

Em um dos recortes anexados pelo DOPS, um artigo datado de 2 de junho de 1935 relata a criação de um diretório da Aliança Libertadora Nacional em Santa Rita.

Leia, a seguir, um trecho do manifesto da ALN local:

“Não somos, vejam bem, um braço do extremismo, que anula o estímulo e esteriliza a vontade de progredir. Queremos dar a mão ao humilde proprietário, franquear-lhe o caminho da salvação econômica e levá-lo a aproximar-se do abastado. Queremos uma Aliança Nacional Libertadora das raças e não das castas.”

Imediatamente após a publicação do manifesto, o delegado afirmava que já tinha avisado o grupo sobre as consequências daquele ato. Na mesma carta afirmou que, como o grupo ainda não havia sido formalizado, não tinha necessidade de tomar qualquer medida.

Agente consular da Suíça em Santa Rita

Muito intrigante é uma correspondência enviada de Santa Rita do Sapucaí, no dia 3 de março de 1942, pelo agente consular da Suíça, Alberto Luercher, em que solicitava do representante consular italiano, Ferrucio Parolari, que advertisse um descendente de italiano residente na cidade. Em tal correspondência, ele afirmava que a delegacia de Santa Rita se opunha a tal cooperação, já que o referido era dono de nacionalidade italiana, morava há mais de 30 anos no Brasil, era casado e tinha filho com uma brasileira. Em tal documento, não conseguimos descobrir por que o agente consular estava na cidade.

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A formatura que recebeu a visita dos agentes

No dia 3 de junho de 1969, uma correspondência informava sobre um ato considerado subversivo, em Santa Rita. Veja um trecho da ocorrência:

“Passando pelas imediações do Clube, notei que, na parede do fundo do prédio, luzes acendiam e apagavam, chamando a atenção com alguns dizeres. Indo ao salão, observei que havia um cartaz escrito “UNE Viva” e, ao lado, duas efígies estavam pintadas de preto com a semelhança de Cristo e de Che Guevara. As pinturas foram apreendidas pelo sargento e enviadas ao escalão superior do 8ºDP.”

No dia 29 de agosto de 1969, os formandos responsáveis pela decoração do baile, redigiram uma declaração em que afirmavam que tudo o que havia sido apreendido era de responsabilidade deles e que nem a Escola de Comércio e nem o Clube Santa-ritense tinha relação com o ocorrido. A correspondência estava assinada pelos seguintes alunos: Antônio Roberto de Franco, Benedito Geraldo de Melo Pereira, Clemilton Silva, Francisco de Souza, Waldir Marques Le-mos, Homero Carneiro Silva e Luiz J. da Silva.

O fim do comunismo

Depois de um longo monitoramento dos ditos comunistas da cidade, através de um documento de 16 de junho de 1947, a delegacia de polícia de Santa Rita acusava o recebimento da ata de fechamento do partido comunista na cidade. O DOPS, por sua vez, arquivou as fichas de filiação de todos os membros do partido.

Uma nova correspondência foi enviada, no dia 14 de março de 1949, em que o DOPS informava ter se dirigido a Santa Rita para conter uma manifestação comunista:

“No final do ano, esteve em Santa Rita o Deputado Ernani Maia, com o objetivo de instalar um Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Reunindo-se com membros do extinto PCB, iniciou uma campanha subversiva induzindo os trabalhadores rurais a buscarem seus possíveis direitos.”

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Livros no leito do Rio

“Segundo foi apurado nas diligências encetadas pelas autoridades policiais, o fato se prende ao encontro, em águas do Rio Sapucaí, de documentos considerados altamente subversivos.
Através das providências levadas a efeito, o delegado fez a apreensão dos citados livros, versando sobre a ideologia extremista, tomando por termo as declarações de pessoas que tinham conhecimento do fato.

No dia 23 de abril, por volta das 14h30min, estava o declarante pescando debaixo da ponte metálica, em companhia de outras pessoas, quando sentiu que seu anzol havia se enroscado em alguma coisa no fundo do rio. Procurando recuperar seu material de pesca, o declarante foi puxando com cuidado, sendo surpreendido com um bornal cinza. Ao verificar, notou que o mesmo continha livros identificados como portadores de ideologia comunista. O declarante procurou queimá-los, temeroso de complicações com a Polícia. Porém, meditando um pouco mais sobre o assunto, decidiu entregar o material ao Tenente Ary.

DOPScima A autoridade policial, apesar de todos os esforços, não conseguiu elucidar o caso e decidiu enviar o inquérito, bem como todos os livros apreendidos a esta delegacia regional.
Foi designado o detetive Roberto Capistrano para encetar diligências em torno do fato, procurando o seu esclarecimento. Após verificar as assinaturas, chegou-se à conclusão de que os livros pertenciam a XXXXXXX em face das rubricas encontradas. O fato estava esclarecido até que apresentou-se o senhor XXXXXX que assumiu a responsabilidade de ter atirado os livros no leito do Rio Sapucaí. Ao ser ouvido, o declarante afirmou que adquiriu os livros em Belo Horizonte e que os mesmos eram publicamente vendidos. Ele negou ser comunista, mas disse que possuía as obras para aperfeiçoamento de seus conhecimentos na literatura de Economia Política da qual foi professor e aluno estudioso da matéria.”

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